sexta-feira, 6 de abril de 2012

O certo e o errado

No parque de estacionamento ela esperava impaciente, com um nervoso miudinho a aflorar-lhe na pele. Uma lua minguante sorria ironicamente no céu. O que estava ela a fazer?
Os largos anos passados em silêncio, cruzando olhares acanhados e percorrendo os mesmos corredores e cantinas, tinham sido ásperos com eles. Era muito jovem para se conseguir revelar com esplendor e confiança. Nos anos seguintes buscara o conforto e a segurança noutros rostos, mas era o "dele" que ela sempre acabava por encontrar nas almofadas das camas onde se deitava.
Aquela noite tinha um sabor especial, um sabor a certo e a errado, a memórias e ao presente. O futuro não tinha lugar ali. O que ali havia era momentâneo, era volátil, mas era o que ambos precisavam para se libertar dos problemas que tinham deixado em casa. Como tinham conseguido transformar a inocência do que em tempos tinham sentido em algo tão nu e cru? Não interessava... 
Retirou o telemóvel da mala e mandou um sms, provocando-o, impregnando-o de desejo. Ela estava ali, à espera dele, embaciando os vidros com a sua respiração adocicada. "Estou a chegar :)", recebeu de volta. A simplicidade daquelas palavras quebrava-a, numa altura que ela própria já tinha vencido as barreiras da timidez.
O coração parecia saltar-lhe no peito, acelerado, excitado. Passou pouco tempo até ouvir o trinco da porta do lado do passageiro. Ele entrou, inundando o assento com um aroma masculino. Ao fim daqueles anos olhavam-se agora sem receios ou pudores, espicaçando-se e atormentando-se mutuamente. 
Ele aproximou-se demasiado, acariciou-lhe os longos cabelos pretos com determinação e puxou-a para ele, encontrando o corpo dela. No texting que ela lhe tinha mandado, tinha-lhe também dito que estava com frio. Acabava de confirmar as camadas de roupa que tinha para despir. 
Longe dali, num cenário que tinha tudo para ser certo, uma mão delgada amparou uma chucha abafando um ténue choro. Enamorada por dois pequeninos olhos tão brilhantes, protegia aquele frágil ser com mel na voz: "O pai já vem..."

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