quarta-feira, 29 de agosto de 2012

A noite é uma criança (6)

As férias vieram e foram, este ano, impregnadas de um cheiro intenso a liberdade, a tempo indeterminado e a horizontes infindáveis. Carregando pequenos luxos que criaram o paraíso, sem esquecer os leves dissabores que bem as caracterizam - não há doce, sem saborearmos antes um pouco do amargo. E os sentidos sendo intensamente despertos: o sal do mar mesclando-se no mel de lábios e o melífluo marulhar espraiando-se sobre as inúmeras texturas de areia, num hino à preguiça de um dia após o outro, tornando-os, no seu conjunto, únicos, mágicos e impagáveis... 
Boas férias! Que tenham sido, estejam ou ainda venham a ser do melhor!

O estalar repetiu-se novamente, mais próximo. A sua respiração não se alterou. Silenciosamente, pegou no cabo do punhal e trouxe-o para a ausência do luar. Nessa altura sentiu o chão estremecer, ao mesmo tempo que o ar pesado à sua volta vibrou com o ressoar de ferro a ser arrastado. Um som abafado, que parecia vir debaixo dos seus pés e que conseguiu agitar a sua alma imperturbável.
Depois, silêncio... Era como se a noite tivesse congelado e a sua balada sido banida da face da terra. Até os grilos e os mochos emudeceram.
Ariadne manteve-se imóvel, camuflando-se contra a parede escura e envelhecida do alpendre. Escutou as batidas do seu coração regressarem ao compasso normal e sentiu o sangue fluir, de novo, ordenadamente debaixo da sua pele, mesmo quando voltou a distinguir o estalido de galhos secos ao longo do jardim, desta vez mais distante. O que quer que se aproximara, afastava-se agora, alertado com a presença de algo mais do que tinha previsto.
Mais ansiosa do que nunca permitiu a si própria, forçou-se a aguardar por algum sinal. Estava impressionada consigo mesma. Já não lhe interessava quem reclamara a sua presença, a meio da noite, na ala mais recatada do palácio, depois da ala arruinada. Conseguia delimitar os seus destroços, de onde estava posicionada, uma massa disforme a arranhar o céu sombrio.
Cada mistério a seu tempo, pensou. E esperou... Mas foi com deceção que mais nada viu acontecer durante os longos minutos que se sucederam. Ao final do que lhe pareceu um tempo interminável, decidiu, então, abandonar o seu posto.
Notou que as suas pernas estavam trôpegas, ao cambalear até à janela. No entanto, não se sentia vencida. Logo pela manhã, que não demoraria muito a chegar, procuraria saber mais sobre as galerias subterrâneas do palácio. Sabia que existiam, embora desconhecesse tudo acerca delas.
Entretanto, estaria atenta...

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